quinta-feira, julho 13

O Estado da Educação

Desabafos de uma professora

Isto está mau para os professores! Agora querem pôr os pais a avaliar os professores! E porque não? Parece-me é que, por uma questão de prioridades, se devia era começar por avaliar os pais. E ninguém melhor que os professores para o fazer. Primeiro porque estão em contacto directo com o produto final do trabalho dos pais como educadores. Depois porque têm formação a nível de avaliação: sabem definir critérios de avaliação e construir os instrumentos de avaliação adequados que permitirão fazer uma avaliação rigorosa e objectiva das competências dos pais como educadores. Proponho que a uma classificação negativa obtida pelos pais corresponda uma multa pecuniária, a duas consecutivas a inscrição compulsiva num “Curso de Formação de Pais” com duração de 15 dias em regime de internamento, e a mais de duas classificações negativas os filhos seriam retirados aos pais pela Segurança Social.

Devo dizer que não sou contra a avaliação dos professores. Os professores dão aulas, produzem documentos, corrigem provas, programam actividades extra-curriculares, organizam visitas de estudo, dinamizam clubes, e todas estas actividades podem ser objectivamente avaliadas. Mas pelos pais? Na minha opinião confiar a avaliação dos professores aos pais é como confiar na divina providência! O que poderão os pais avaliar? O relacionamento professor-aluno? Com base em quê? Nos relatos dos filhos? Será que um professor exigente, pouco simpático, cáustico ou corrosivo, é um professor incompetente? Talvez não seja apreciado pelos pais mesmo que seja cientificamente competente, use técnicas e estratégias de ensino diversificadas, elabore bons materiais de trabalho, cumpra os programas e mantenha com os alunos um relacionamento institucional correcto. Não me parece justo fazer depender a avaliação de um professor de apreciações emocionais como são muitas vezes as dos pais.

Não quero com isto dizer que os pais não sabem avaliar os professores. Os pais sabem muito bem se os professores dos seus filhos são bons ou maus. Se os seus filhos vêm da escola a saber mais coisas, com vontade de aprender, com hábitos de trabalho, com mais autonomia para realizar as tarefas que os professores propõem. Os pais vêm o resultado do trabalho dos professores. Mais do que “ver”, “sentem”! Essas apreciações dos pais devem chegar e já chegam à escola e aos professores. Mas passar esse tipo de avaliação para a participação na atribuição de uma classificação do desempenho de um professor com consequências na sua progressão na carreira parece-me, francamente, um abuso e um atentado à dignidade do professor que pode ter consequências muito nefastas no relacionamento institucional entre professores, pais e alunos.

Outro aspecto da avaliação dos professores é tentativa de a fazer depender ou relacioná--la com os resultados dos seus alunos. É outra coisa com que não posso concordar! Embora não gostando de comparar o que não é comparável perdoem-me este exemplo: se os médicos fossem avaliados pelos doentes que curam como ficava um médico de oncologia? Na minha opinião um bom aluno tanto brilha com um bom professor como com um mau professor e um mau aluno é uma dor de cabeça para qualquer professor. E todos os professores sentem na pele que se um aluno tem bons resultados é muito dotado, esperto, inteligente… se tem maus resultados é o professor que é uma nódoa!

A avaliação, quer seja de um aprendiz, de um profissional, de um curso ou de outra coisa qualquer é um processo complexo, com elevado grau de subjectividade e que exige a aplicação de técnicas que se tenta que sejam o mais rigorosas e objectivas possível. Os professores sabem disso porque sempre lidaram com avaliação e receberam formação nesse sentido. A avaliação é tanto mais delicada quanto maiores forem as suas implicações na vida das pessoas. Todas as pessoas sabem que têm que se submeter a avaliação ao longo da vida. Não acredito que os professores estejam contra a avalição. Só acho que devemos exigir, como os alunos e os pais exigem, rigor, objectividade e justiça na avaliação.

Longe vão os tempos em que o professor (como o médico e o senhor padre) era reconhecido pela sociedade e respeitado como pessoa sabedora e que contribuía para a melhoria da qualidade de vida encarregando-se da formação dos mais novos. Quando escolhi o meu curso era muito nova. Escolhi-o porque gosto da Ciência. Actualmente, como professora de ciências, gosto de dar aulas, gosto de prepara aulas, gosto de pesquisar novas formas de ensinar, gosto de trabalhar no “meu” laboratório da “minha” escola. Não gosto de corrigir testes, acho que ninguém gosta! Mas, se fosse hoje, garanto que não tinha escolhido um curso de formação de professores! Estou até tentada a acreditar no meu tio que dizia, há muito tempo, que só vai para professor quem não sabe fazer mais nada!
(Leitora devidamente identificada)

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